15.8.01

- Parece-me que compreendo você - disse a Maga, acariciando-lhe o cabelo. - Você está procurando alguma coisa e não sabe o que é. Eu também. E também não sei o que é. Mas são duas coisas diferentes. Aquilo de que vocês falavam na outra noite... sim, você é mais um Mondrian que uma Vieira da Silva.

- Ah! - exclamou Oliveira. - Então, eu sou um Mondrian.

- Sim, Horácio.

-Você quer dizer qe eu sou um espírito cheio de rigor.

- Eu disse um Mondrian.

- E você não desconfiou que por trás desse Mondrian pode começar uma realidade Vieira da Silva?

- Oh, sim - respondeu a Maga. - Mas você, até agora, não saiu da realidade Mondrian. Tem medo, quer estar seguro. Não sei de quê... Você é como um médico, não como um poeta.

- Deixemos os poetas de lado - disse Oliveira. - E não faça o pobre Mondrian ficar mal com a comparação.

- Mondrian é uma maravilha, mas não tem ar. Eu afogo-me um pouco dentro da sua pintura. E quando vocÊ começa a dizer que seria necessário encontrar a unidade, eu vejo as coisas bonitas, mas mortas, flôres dissecadas e coisas assim.
Trecho de um diáogo entre os protagonistas de O Jogo da Amarelinha, de Julio Cortázar. Página 73, capítulo 19.